quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Pronto Atendimento de Santo André - 15 de Novembro de 2006

Quando chega na enfermaria do Pronto-Atendimento Central de Santo André, Aurora Flores* vê uma sala cheia de poltronas cinzas contornando o espaço. Sobre elas, pacientes conversando, gemendo ou apenas olhando assustados para algum lugar do vazio. Também há alguns pacientes sobre macas. As poltronas, muitas delas já surradas e mostrando a espuma por baixo do courim, ficam encostadas às paredes, dificultando que se possa recliná-las para deitar. Muitos idosos se ajeitam em seu desconforto.

No centro da sala, um grande balcão onde as enfermeiras se fecham carrancudas. Somente quando alguma delas solta um desejo escondido é que as demais parecem se animar junto. "Acho que com isso (aponta um frasquinho) afeta o sistema digestivo. Será que ele morre?", ela torce com olhar divertido. Os pacientes e acompanhantes que estão por perto, chocam-se silenciosamente com a brincadeira da enfermeira. Sem perceber, ela sai com seus cabelos loiros levemente desgrenhados e rugas incipientes em direção a um paciente nas salas reservadas.

Aurora Flores chegou lá com uma suspeita de derrame, ou mais precisamente, Acidente Vascular Transitório. Como não há aparelho para fazer tomografia, Aurora fica sob observação para aguardar se aparece alguma seqüela e, então, possam encaminhá-la para o exame em outro local. Enquanto isso, tentam manter sua pressão um pouco mais elevada do que o normal, a fim de garantir o bombeamento de sangue para o cérebro. Por isso, é necessário medir a pressão dela com freqüência.

Sua neta, Carla dos Santos*, aguarda um tempo num dos corredores do Pronto, defronte a um consultório onde um médico baixo, atarracado e de óculos atende. Embora seja feriado de 15 de novembro, Carla passou longe de ter qualquer descanso. Sua avó está doente. Avó que é quase mãe, pois foi quem cuidou da moça quando esta era criança. Seus pensamentos voam, cheios de temor, esperança e fé. Fixando os olhos no fluxo de sua imaginação, leva um susto quando o médico no consultório em frente chama sua atenção.

- Por que você está me olhando?, pergunta franzido.

Carla responde que não estava olhando para ele. Não estava olhando para lugar nenhum especificamente.

- Então, por favor, vá para outro lugar. Não fique em frente à minha sala, ralhou.

Ela obedece com um misto de angústia, desamparo e raiva.

*Os nomes reais foram alterados para preservar as pessoas

Nenhum comentário: