quinta-feira, 20 de setembro de 2007
Em Busca Dela, Que se Vestia de Talvez
Passava suspenso, correndo ao andar, andando de supetão em supetão. Mas teve que olhar uma rachadura verde, brotando um pequeno fio estirado de musgos que espichavam um mundo escondido para fora de uma parede de fábrica. Galpão marrom, grande, fechado, lá dentro um pisar de máquinas revezando seus barulhos. Atravessou nova rua com o aconchego daquela imagem de musgos na frente de seu olhar. Quando a rua fez curva, ia explodir de mágica pronto a vê-la. Mas não estava lá. Avistou um cruzamento à frente. Sabia que ela tinha virado à esquerda na rua do posto. Sabia porque sentia. Já não havia reforço de seu perfume no ar, mas ainda conservava a memória de alguns minutos atrás, quando seu cheiro tinha entrado íntimo em seu nariz.
quarta-feira, 19 de setembro de 2007
Esquerdas Capitalistas e os Anões Gigantes
Muitas vezes os grupos organizados em partidos, organizações burocráticas de esquerda (ou de esquerda burocrática) reivindicam para si a totalidade da revolução. E, no entanto, talvez os pequenos grupos minoritários das revoluções moleculares estejam fazendo muito mais pela revolução do que aqueles. Estes pequenos por vezes não são considerados pertinentes pelos grupos explicitamente revolucionários, que se outorgam o modelo de como ser revolucionário de forma acachapante e homogeneizante. No entanto, os “pequenos” às vezes causam muito mais rachaduras no capitalismo do que aqueles que esperam o “grande dia” sem perceber o valor das pequenas subversões de grande impacto (pequenos, pequenos, pequenos).
Respeitar as singularidades. Horizontalizar as relações – ao invés de ficar formando quadros hierárquicos (Por saberes? Por liderança? Por carisma? Por experiência partidária?) que reproduzem, e pior, reforçam o modelo de hierarquizações capitalista.
É por isso que a revolução também precisa acontecer nos níveis moleculares (escolas, rádios, veículos de comunicação, ciências, grupos minoritários, cotidiano, hospitais, mentalidades, família etc.). Caso contrário, mesmo os mais esquerdistas não farão senão reproduzir o vírus capitalista em uma estrutura chamada socialista. E esse vírus pode fazer com que a sociedade socialista reivindicada (e construída) seja tão doente quanto o capitalismo. E, ironicamente, doente pela contaminação do vírus capitalista, adquirido do corpo moribundo do capitalismo que lhe inoculou nos níveis moleculares e ao qual os grupos revolucionários de esquerda não se preocuparam em exterminar – por acharem que não fazia parte das preocupações mais fundamentais e urgentes da revolução; enfim, por acharem que eram questões menores e pós-modernas (o velho vício de confrontar um argumento, não com outro argumento, mas com um rótulo acachapante e desqualificador)...
Respeitar as singularidades. Horizontalizar as relações – ao invés de ficar formando quadros hierárquicos (Por saberes? Por liderança? Por carisma? Por experiência partidária?) que reproduzem, e pior, reforçam o modelo de hierarquizações capitalista.
É por isso que a revolução também precisa acontecer nos níveis moleculares (escolas, rádios, veículos de comunicação, ciências, grupos minoritários, cotidiano, hospitais, mentalidades, família etc.). Caso contrário, mesmo os mais esquerdistas não farão senão reproduzir o vírus capitalista em uma estrutura chamada socialista. E esse vírus pode fazer com que a sociedade socialista reivindicada (e construída) seja tão doente quanto o capitalismo. E, ironicamente, doente pela contaminação do vírus capitalista, adquirido do corpo moribundo do capitalismo que lhe inoculou nos níveis moleculares e ao qual os grupos revolucionários de esquerda não se preocuparam em exterminar – por acharem que não fazia parte das preocupações mais fundamentais e urgentes da revolução; enfim, por acharem que eram questões menores e pós-modernas (o velho vício de confrontar um argumento, não com outro argumento, mas com um rótulo acachapante e desqualificador)...
terça-feira, 18 de setembro de 2007
Uma Poesia do Sim Resgatado
Andar, no meio do começo, na trincheira dos desafios, no sono do medo, aproveitando para pular sobre as sentinelas olhudas. Eufórica, a notícia do sim, a fonte das dúvidas, a crise e a crase em direção à ela. A todos, um grande gesto-flecha, pontuda ponta de perguntas, sempre valiosas.
O feminino, o masculino, a chupada fenomenal da ansiedade no falo da entrega. O mergulho no gozo da grande dúvida. A serenidade, o pão, as carroças, o antigo e o novo. O hoje na promessa do amanhã que se planta no agora.
Sim, são sempre novos os silvos da vida que passa pela pequena brecha da porta. Sempre presentes na rachadura do dia, ainda que a manhã seja apagada. Eufórica, a constelação de desejos, que como diz um aí, é sempre o desejo do Outro. Mas com cantos solenes de despedida, no coral afinadíssimo, encomendei um tchau ao Outro que não quer, ao Outro que quero que me queira. Porque com véus dos ritos e calcinhas do puteiro, ela me quis.
Seu nome?
Terça-feira ou O Enigma da Bela Idosa Amante do Vento
O feminino, o masculino, a chupada fenomenal da ansiedade no falo da entrega. O mergulho no gozo da grande dúvida. A serenidade, o pão, as carroças, o antigo e o novo. O hoje na promessa do amanhã que se planta no agora.
Sim, são sempre novos os silvos da vida que passa pela pequena brecha da porta. Sempre presentes na rachadura do dia, ainda que a manhã seja apagada. Eufórica, a constelação de desejos, que como diz um aí, é sempre o desejo do Outro. Mas com cantos solenes de despedida, no coral afinadíssimo, encomendei um tchau ao Outro que não quer, ao Outro que quero que me queira. Porque com véus dos ritos e calcinhas do puteiro, ela me quis.
Seu nome?
Terça-feira ou O Enigma da Bela Idosa Amante do Vento
quinta-feira, 6 de setembro de 2007
Pronto Atendimento de Santo André - 15 de Novembro de 2006
Quando chega na enfermaria do Pronto-Atendimento Central de Santo André, Aurora Flores* vê uma sala cheia de poltronas cinzas contornando o espaço. Sobre elas, pacientes conversando, gemendo ou apenas olhando assustados para algum lugar do vazio. Também há alguns pacientes sobre macas. As poltronas, muitas delas já surradas e mostrando a espuma por baixo do courim, ficam encostadas às paredes, dificultando que se possa recliná-las para deitar. Muitos idosos se ajeitam em seu desconforto.
No centro da sala, um grande balcão onde as enfermeiras se fecham carrancudas. Somente quando alguma delas solta um desejo escondido é que as demais parecem se animar junto. "Acho que com isso (aponta um frasquinho) afeta o sistema digestivo. Será que ele morre?", ela torce com olhar divertido. Os pacientes e acompanhantes que estão por perto, chocam-se silenciosamente com a brincadeira da enfermeira. Sem perceber, ela sai com seus cabelos loiros levemente desgrenhados e rugas incipientes em direção a um paciente nas salas reservadas.
Aurora Flores chegou lá com uma suspeita de derrame, ou mais precisamente, Acidente Vascular Transitório. Como não há aparelho para fazer tomografia, Aurora fica sob observação para aguardar se aparece alguma seqüela e, então, possam encaminhá-la para o exame em outro local. Enquanto isso, tentam manter sua pressão um pouco mais elevada do que o normal, a fim de garantir o bombeamento de sangue para o cérebro. Por isso, é necessário medir a pressão dela com freqüência.
Sua neta, Carla dos Santos*, aguarda um tempo num dos corredores do Pronto, defronte a um consultório onde um médico baixo, atarracado e de óculos atende. Embora seja feriado de 15 de novembro, Carla passou longe de ter qualquer descanso. Sua avó está doente. Avó que é quase mãe, pois foi quem cuidou da moça quando esta era criança. Seus pensamentos voam, cheios de temor, esperança e fé. Fixando os olhos no fluxo de sua imaginação, leva um susto quando o médico no consultório em frente chama sua atenção.
- Por que você está me olhando?, pergunta franzido.
Carla responde que não estava olhando para ele. Não estava olhando para lugar nenhum especificamente.
- Então, por favor, vá para outro lugar. Não fique em frente à minha sala, ralhou.
Ela obedece com um misto de angústia, desamparo e raiva.
*Os nomes reais foram alterados para preservar as pessoas
No centro da sala, um grande balcão onde as enfermeiras se fecham carrancudas. Somente quando alguma delas solta um desejo escondido é que as demais parecem se animar junto. "Acho que com isso (aponta um frasquinho) afeta o sistema digestivo. Será que ele morre?", ela torce com olhar divertido. Os pacientes e acompanhantes que estão por perto, chocam-se silenciosamente com a brincadeira da enfermeira. Sem perceber, ela sai com seus cabelos loiros levemente desgrenhados e rugas incipientes em direção a um paciente nas salas reservadas.
Aurora Flores chegou lá com uma suspeita de derrame, ou mais precisamente, Acidente Vascular Transitório. Como não há aparelho para fazer tomografia, Aurora fica sob observação para aguardar se aparece alguma seqüela e, então, possam encaminhá-la para o exame em outro local. Enquanto isso, tentam manter sua pressão um pouco mais elevada do que o normal, a fim de garantir o bombeamento de sangue para o cérebro. Por isso, é necessário medir a pressão dela com freqüência.
Sua neta, Carla dos Santos*, aguarda um tempo num dos corredores do Pronto, defronte a um consultório onde um médico baixo, atarracado e de óculos atende. Embora seja feriado de 15 de novembro, Carla passou longe de ter qualquer descanso. Sua avó está doente. Avó que é quase mãe, pois foi quem cuidou da moça quando esta era criança. Seus pensamentos voam, cheios de temor, esperança e fé. Fixando os olhos no fluxo de sua imaginação, leva um susto quando o médico no consultório em frente chama sua atenção.
- Por que você está me olhando?, pergunta franzido.
Carla responde que não estava olhando para ele. Não estava olhando para lugar nenhum especificamente.
- Então, por favor, vá para outro lugar. Não fique em frente à minha sala, ralhou.
Ela obedece com um misto de angústia, desamparo e raiva.
*Os nomes reais foram alterados para preservar as pessoas
terça-feira, 4 de setembro de 2007
Manifesto Pró-Jornalismo (rejeito)
Para ser "pró alguma coisa", muitas vezes é preciso identificar os inimigos. Para acolher o jornalismo, é preciso rejeitar. Então vai aí o protesto-rejeito:
- rejeito o jornalismo em que o repórter domina uma situação com o entrevistado ao invés de se abrir a ela;
-rejeito o jornalismo do pré-roteiro;
- rejeito o jornalismo de gabinete;
- rejeito o jornalismo comedido (me ajuda aí, Bandeira) e bem comportado;
- rejeito o jornalismo em que o repórter sai com hora marcada para voltar;
- rejeito o jornalismo das entrevistas de cinco minutos;
- rejeito o jornalismo em que o repórter somente suga seus entrevistados e não aceita uma relação de troca;
- rejeito o jornalismo da prepotência;
- rejeito o jornalismo da superioridade do jornalista em relação às situações que observa ou (pior ainda) aos seus entrevistados;
- rejeito o jornalismo medroso;
- rejeito o jornalismo sem criatividade e refém dos press-releases (conseqüência inevitável do repórter que não sai a campo ou não enxerga o que olha);
- rejeito o jornalismo manualzinho de regras e padrões;
- rejeito o jornalismo sem causa (tenho percebido que não ter causa é pior e mais cínico do que ter uma causa elitista);
- rejeito o jornalismo empáfia;
- rejeito o jornalismo que diz que tudo o que sai do padrão sem gosto é nariz de cera;
- rejeito o jornalismo “bom é o que faz mais rápido”;
- rejeito o jornalismo “fofocas de governo”;
- rejeito o jornalismo que usa o(s) conceito(s) de objetividade para justificar qualquer atitude desumana, linguagem robótica e exclusividade de voz às autoridades.
Manda aí a sua rejeição também. E foda-se o jornalismo com cara de sofá e assoalho lustrado. E viva o jornalismo!
- rejeito o jornalismo em que o repórter domina uma situação com o entrevistado ao invés de se abrir a ela;
-rejeito o jornalismo do pré-roteiro;
- rejeito o jornalismo de gabinete;
- rejeito o jornalismo comedido (me ajuda aí, Bandeira) e bem comportado;
- rejeito o jornalismo em que o repórter sai com hora marcada para voltar;
- rejeito o jornalismo das entrevistas de cinco minutos;
- rejeito o jornalismo em que o repórter somente suga seus entrevistados e não aceita uma relação de troca;
- rejeito o jornalismo da prepotência;
- rejeito o jornalismo da superioridade do jornalista em relação às situações que observa ou (pior ainda) aos seus entrevistados;
- rejeito o jornalismo medroso;
- rejeito o jornalismo sem criatividade e refém dos press-releases (conseqüência inevitável do repórter que não sai a campo ou não enxerga o que olha);
- rejeito o jornalismo manualzinho de regras e padrões;
- rejeito o jornalismo sem causa (tenho percebido que não ter causa é pior e mais cínico do que ter uma causa elitista);
- rejeito o jornalismo empáfia;
- rejeito o jornalismo que diz que tudo o que sai do padrão sem gosto é nariz de cera;
- rejeito o jornalismo “bom é o que faz mais rápido”;
- rejeito o jornalismo “fofocas de governo”;
- rejeito o jornalismo que usa o(s) conceito(s) de objetividade para justificar qualquer atitude desumana, linguagem robótica e exclusividade de voz às autoridades.
Manda aí a sua rejeição também. E foda-se o jornalismo com cara de sofá e assoalho lustrado. E viva o jornalismo!
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