Suspirava e inspirava, um longo caminho de ida e volta que atravessava a alma, teimando em animar o corpo enfraquecido. Soltava o ar, contraindo os olhos caídos.
Repetitivo, o barulhinho do aparelho que fiscalizava os sôfregos passos de seu coração dentro da vida.
Todos ao redor da cama. Olhavam silenciosos. Uma enfermeira no fundo do quarto. E debaixo de todos aqueles olhares reverentes, um esforço para mostrar que ainda queria ficar mais um pouco com cada um, como uma prova de amor. Fazia força para não expor sua dificuldade de trazer o ar ao pulmão esvaziado. Queria que não sofressem, bastava ele.
Com um pigarro proposital, o médico entrou no quarto. Falou num tom baixo e amigável. “Pessoal, agora vocês precisam sair”. Esboçou uma face simpática e esfregou as mãos no jaleco, concentrando nas pontas dos dedos a certeza que queria esconder.
Mas todos sentiam que aquela deveria ser a despedida. A cirurgia seria um ritual para servir mais à consciência do que à vida. Havia chance de 5 por cento, no máximo, segundo informou a junta médica.
Foi naquele instante, quando começaram a desejar boa sorte, abençoar e tocar a fronte do doente que aconteceu. Nos olhos daquele homem surgiu uma profundidade infinita. Seu olhar, antes esquálido como seus braços, agora se tornavam agudos e vastos ao mesmo tempo. Seus lábios se moveram e a bochecha ergueu o fino tubo que se dividia entrando por suas narinas. E sua boca pronunciou anasalada. “Eu queria que vocês sentissem a minha paz. Vão em paz”.
Eles saíram lentos, derramando lágrimas rápidas, deixando para trás alguém que sustentava um leve e novo sorriso. Sorriso que ele mesmo nunca conseguiu explicar de onde veio, nem com a ajuda do vinho e dos pinhões nas muitas festas juninas que se seguiram após essa tarde.
quarta-feira, 28 de julho de 2010
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